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6 cenários para o futuro da criação de conteúdo

Por Eduardo Fernandes.

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Pelo título, parece até que essa é uma daquelas newsletters úteis. Mas, naah.

É que, por algum débito cármico, ontem topei com o texto "1,000 True Fans? Try 100", publicado no novo site da mega empresa de investimento em tecnologia, a16z.

Fiquei um tanto confuso.

Como é? Agora não preciso mais de mil fãs? Caiu para 100? Isso facilita ou complica minha vida? Não entendo direito esse misterioso gênero de literatura, as "Estatísticas de Países Desenvolvidos".

Contextualizando #

  1. Oi, sou Eduardo Fernandes, Máquina Espiritual 2046. Graças a um trauma de infância, sou "criador de conteúdo", desde sempre. Profissionalmente, a partir de 1995. Aperte o sininho, deixe seu like e assine o canal.
  2. Em 2008, o escritor Kevin Kelly propôs que, com o crescimento da Internet, alguém como eu precisaria de cerca de mil Fãs Verdadeiros (FV) para se sustentar superbem. E FV significa: "alguém que compra tudo o que você produz". Uou. Se você arrecadasse apenas U$ 100 por pessoa por ano, isso lhe daria U$ 100 mil. Uou!
  3. Parecia algo factível. Mas, antes mesmo de eu conseguir chegar lá, o cenário mudou. Li Jin, do Future from a16z, propõe atualizar o número:

(...) No Patreon, a média da mensalidade inicial aumentou 22% nos dois últimos anos. Desde 2017, a parcela de novos patrocinadores pagando mais de U$ 100 mensais – ou US$ 1,200 por ano – cresceu 21%. No Podia, o número de criadores arrecadando mais de US$ 1 mil por mês vêm cresendo 20% ao mês, enquanto que a média de consumidores por criador cresce a 10%. Similarmente, no Teachable, o preço médio por curso vem crescendo 20% ao ano. Em 2019, cerca de 500 criadores de cursos no Teachable fizeram mais de US$ 100 mil; desses, 25 mais de US$ 1 mil por venda.

Incrível.

Ainda que haja tantas plataformas, taxas e criadores concorrendo entre si, é possível chegar ao sonho do fã próprio. Estou apaixonado por essa economia da paixão. Pelo menos essa que aparece nos sites de marketing norte-americanos.

E se essa tendência aumentar ainda mais? Em vez de 100 FV, precisássemos de apenas 10? Ou de 1?

Enfim, tenho zero talento para negócios. Mas preciso justificar meu pHD em futurogia, orientado por Nostradamus. Então, cheguei a vários Cenários Absurdos®:

1. Neomecenas 1:1 #

Um aristocrata pagando um criador. Familiar sustentando prole também vale. Mas será que meu pai seria meu fã? Hmm.

2. Super patrões #

100 bilionários pagando 10 pastéis e 1 Itubaína para toda uma massa planetária de criadores esfomeados.


E, aqui, vale uma pausa.

Patronagem nunca foi algo simples. Muitos dos mecenas do passado costumavam intervir nas obras. Melhore esse nariz, tire o anjo dali. Não toque naquele assunto. Cubra aquela genitália. Pode me colocar num cavalo branco?

Claro, os artistas reclamavam. Alguns até se envolviam com a criminalidade e fugiam para ilhas remotas na Itália.

Outros enganavam os patrões, como aconteceu com a Catedral St Paul, na Inglaterra. O arquiteto, Sir Christopher Wren, colocou uns muros na frente da obra (a invenção do biombo?) e disfarçou: "Pode deixar, estou construindo uma Igreja simples, bem anglicana". No final, entregou uma catedral barroca monumental.

Fora que os patrocinadores nem sempre eram exatamente honestos. Muitas vezes, os trabalhadores eram "mecenas forçados" de elites, que, depois, re-mecenavam a arte. Você dormiria bem, sabendo que foi financiado por um genocídio? Ou por escravidão? Ou por lavagem de dinheiro?

Enfim, de volta à programação normal.


3. Sugar Artist #

Não gosto da ideia de fã. Prefiro a de "conexão". Há gente que se conecta com minha busca pessoal. De alguma forma, meu trabalho engatilha e dispara epifanias latentes em suas próprias cabeças. Não é culpa minha. Não me venha com essa.

Portanto, poderia surgir algo que explorasse essa tendência conectiva. Uma versão (não necessariamente sexual) do modelo Sugar Baby. Ou seja: o artista presta vários serviços, nem sempre artísticos. Às vezes conversa, funciona como um terapeuta light, amigo ocasional, confidente, entretém a família. E espera uma compensação monetária, se possível. Mas também vale uns mantimentos, pagar umas contas ou receber roupas usadas.

Tudo sem o peso político do casamento. Sem exclusividades ou contratos estranhos com corporações monopolistas.

4. Todo mundo faz e consome tudo de graça #

Quanto mais a criação de conteúdo se populariza, maior é o risco de ela perder a mística. Consequentemente, noções como a divisão entre patrões e patrocinados, permanência, obsolescência, catalogação e pureza de conhecimento poderão sofrer mutações.

Talvez, isso marcará o fim de uma época, mais ou menos resgatando um dos sentidos ancestrais da cultura popular: coisa que se faz nas ruas, sem glamour, sem muita tecnologia, uns interrompendo os outros para fazer suas intervenções improvisadas (ou informadas por tradições). Um caos não necessariamente industrializável. Todos fãs e patrões uns dos outros, ao vivo. De máscara, é claro.

É complicado #

Enfim, tudo isso para dizer que a história da arte e da produção de conhecimento é um "catch me if you can" sem fim. Minha tendência ranzinza é achar que artigos como os de Kevin Kelly e Li Jin são um tanto reducionistas. Mas, de repente, eu é que complico demais.

Hoje precisamos fugir dos copyrights strikes, dos algorítimos, fazer parkour entre links afiliados e jabás do Amazon. As forças padronizadoras de cultura são os Clicks Hungry Ghosts, YouTube Creators Academy, os formatos das "plataformas". No passado, supostamente eram as guerras políticas e religiosas. No futuro, sabe-se lá. De repente, como diz Mark Hurst, NÃO consumir conteúdo será um ato de resistência, de ativismo cultural.

Até a própria ideia de trabalho, no geral, vem mudando rapidamente. Nos países mais ricos, quem diria, imigrantes começam a recusar empregos mais brutais e arriscados. Até mesmo a (um dia assustadora) ideia de renda básica se torna mais aceitável para setores conservadores da sociedade.

Enfim. Não sei. As coisas estão um tanto instáveis.

Mas… ah. Antes de encerrar, eu tenho que mencionar os outros dois cenários:

5. Distopia Extraordinária

Computadores produzem, sustentam e consomem cultura. Humanos apagam incêndios, sobrevivem a vírus e enchentes.

6. UFOs ufanistas

Extraterrestres baixam na Terra e assumem a cultura, trazendo a Era de Lambada Infinita, na qual passaremos os dias dançando curvilineamente, com as mãos nas cinturas uns dos outros.

Ajudei em alguma coisa?