Por Eduardo Fernandes.
Ah, a expectativa, essa destruidora de experiências humanas. Onde quer que ela aparece, causa decepção. É automático. E mesmo que você saiba disso, que pense no assunto sistematicamente, ainda assim, cai na armadilha.
Do que estou falando? Ora, do filme Oppenheimer, claro. De que mais seria? Amor? Trabalho? É claro que expectativas não influenciam essas coisas, não é? Quem afirmaria tal absurdo? É só sobre cinema mesmo, garanto.
Enfim, assisti ao filme de Christopher Nolan numa sala de cinema em Sebastopol, Califórnia. Portanto, sem legendas. Lá pelas tantas, achei que estava perdido na tradução. Não conseguia entender boa parte do que era dito. Envergonhado, chequei com meus amigos nativos. Situação parecida. O volume da trilha sonora e do sound design era tão alto, que tornava o uso de legendas necessário.
Aliás, a música é onipresente, criando um clima de tensão constante. Praticamente, não há dinâmica. Não há pausas pra respirar e se conectar emocionalmente com a história.
Talvez o assunto do filme seja tão forte que liberou Nolan pra contar a história como um trem descarrilhado. Uma bomba no ritmo de uma metralhadora. Algumas pessoas não querem vê-lo pra não ficarem depressivas. É muito mais provável que fiquem cansadas.
Talvez, eu é que tenha me habituado demais aos seriados. Eles propiciam mais tempo, dão maior espaço pra velhas estratégias narrativas, como desenvolvimento de personagens e dinâmica.
Em Oppenheimer, mesmo a cinematografia, planejada pra ser inovadora, acaba afogada no meio da correria. Você até percebe que há algo interessante ali. Sabe que o diretor evitou usar computação gráfica no filme. Mas, no geral, não tem tempo de usufruir do seu esforço estético.
Oppenheimer é um filme pra ser revisto. Ou pra ser decodificado na Internet. E tudo bem, esse é o ambiente cognitivo do cinema hoje em dia.
Mas, sinceramente, eu não teria paciência pra me submeter novamente a toda a verborragia do filme. Nesse sentido, talvez os vídeos de análise no YouTube sejam melhores do que a obra em si. Você vai direto ao ponto.
Além disso, a não ser que você seja um cientista político ou advogado, filmes de tribunal só funcionam quando se focam na análise das emoções dos personagens. Nolan não parece ter muito tempo pra isso.
Assuntos como a criação da bomba nuclear são muito controversos e multifacetados. Então, é praticamente impossível ter acuracidade histórica numa única obra, mesmo com 3 horas de duração.
Assim, estranhamente, filmes como o clássico Das Boat tendem a ser mais “realistas” do que Oppenheimer. Porque conseguem despertar empatia, se comunicam com um nível de compreensão humana mais profundo do que as disputas verbais. Transmitem uma acuracidade estrutural, psicológica, que resiste a teorias da conspiração e desinformações.
Eu gostaria de assistir a um filme que mostrasse como foi transportar duas bombas nucleares do meio do deserto até o aeroporto, onde seriam enviadas pro Japão.
Como eram os motoristas? Como era a tensão dos soldados, carregando um pacote tão letal? Eles sabiam o que estavam levando? Como eram suas reações a cada buracos na pista, suas conversas com suas famílias? As paradas pra mijar no posto de gasolina? O medo de encontrar um obstáculo no meio do caminho e acabar destruindo toda uma cidade norte-americana?
O único momento do filme em que consegui sentir essa conexão humana nua e pura, foi na tensão pré-detonação do primeiro teste da bomba. Mas logo o ritmo de TikTok foi retomado. Mesmo quando os cientistas receberam as notícias sobre Hiroshima e Nagasaki.
Minha primeira impressão de Oppenheimer é que o filme está contaminado pela lógica dos filmes de super-heróis. Até mesmo na arte do cartaz. Não é a computação gráfica que define esse gênero. É a velocidade e uma maneira mais “bombástica” de construir personagens.
Como se vê, expectativa é broxante. Muita gente odeia spoiler. Mas expectativa é muito pior. Seja quando nos incita a gostar ou odiar. Mas quem tem a disciplina necessária pra evitar se informar sobre algo, hoje em dia?
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