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A invasão dos falsos influenciadores

Por Eduardo Fernandes.

Transcrição do episódio #

Hoje em dia, quase mundo todo conhece a expressão fake news, certo? É um nome contemporâneo para um fenômeno muito velho: manipular a informação para conseguir certos interesses.

Também não é novidade que a indústria cultural usa personagens fictícios para vender produtos. Não faltam exemplos. Estrelas de cinema e música, políticos, escritores, líderes religiosos e acadêmicos que trabalham com divulgação científica.

Boa parte dos nossos valores e entretenimento vem de influenciadores criados por agências de publicidade e/ou agências governamentais. É uma das coisas mais comuns desde o começo do século 20.

Fake influencers é a expressão contemporânea para designar esse fenômeno.

Num episódio recente do podcast Recode Daily, dois jornalistas da Vox Media tentam descrever a nova encarnação dele, os fake infuencers do TikTok. O link vai estar na descrição do episódio.

Esse tipo de TikToker vem empoderado pela Inteligência Artificial e também se aproveita daquela espontaneidade típica de rede social ("Hey, Guys!"), essa descontração que vem se provando bastante calculada, ensaiada.

Porém, no Twitter, YouTube, etc., o influenciador demora um bom tempo para construir uma audiência. No TikTok, pode se tornar viral da noite para o dia. E as agências de publicidade estão de olho nessa, digamos, otimização de consumo.

Algumas técnicas facilitam o surgimento dos influenciadores falsos. Ou melhor, vamos descrever de outra forma: a atrofia da capacidade de análise, de distinguir entre a espontaneidade natural e a artificial, produzida por agências.

Um processo parecido já aconteceu com a indústria da alimentação: ao longo dos anos, perdemos a sensibilidade para produtos naturais e aprendemos a aceitar e desejar comida processada.

Então, a comida precisa ser rápida, barata, acessível e cada vez mais extrema (muito sal, muito tempero, muito açúcar). Tem que vir embalada numa certa informalidade: slogans, desenhos de vaquinhas felizes, etc.

E nos acostumamos a padrões cada vez mais profundos de desinformação e de passividade (não preciso saber o que tem nessa caixa, não quero cozinhar, nem limpar, nem pensar nas consequências da minha alimentação).

Em resumo: esse é o velho e bom processo gradual de alienação, de nos desconectar dos processos da vida. Agora chegando ao mundo intelectual. Trocar o conhecimento pela rapidez, pelo preço barato, pela facilidade e pela padronização.

As redes sociais ajudam a uniformizar o pensamento e até a crítica. Temos que encaixar as ideias em padrões rígidos, como número de caracteres, periodicidades, técnicas de visibilidade, algorítimos e limites de tempo.

E como todo conteúdo acaba um tanto parecido, como o consumo é extremamente acelerado, nos mantemos num ritmo de reação, não de reflexão.

Assim, as fronteiras entre o que é espontâneo e o que é produzido por agências, ficam cada vez mais nubladas. No fundo, até criadores de carne e osso, como eu, acabam se tornando um tanto fake influencers.

Agora, o mais interessante é que, assim como aconteceu na indústria alimentícia, há quem proponha rótulos para o conteúdo postado nas redes.

No caso, hashtags indicando que o texto ou vídeo pode ser falso, ou processado, produzido por agências. Esse é o caminho proposto pelos apresentadores do Recode Daily.

Já é alguma coisa. Mas você já sabe o que acontece quando surgem rótulos: apenas uma minoria lê. Essa é uma gambiarra que tenta consertar um problema mais sistêmico e multifacetado.

Enfim, será que, em breve, vamos ter que assistir a algum tipo de equivalente às informações nutricionais dos pacotes de comida?

Como seria isso? “Informações Intelectuais”? Este vídeo contém 20 segundos de conteúdo não-verificado, 90% de atuações profissionais e… contém glúten?

Citado no episódio #


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