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Comentando Fallen Angels, de Wong Kar-wai

Comentando Fallen Angels, de Wong Kar-wai

Por Eduardo Fernandes.

Qual é a primeira coisa que vem à sua cabeça quando você pensa sobre os filmes de Wong Kar-wai? Na minha, são as cores.

É claro: o cineasta chinês é reconhecido por suas explorações sobre as armadilhas dos relacionamentos amorosos, mas tudo é filtrado por uma direção de arte que enfatiza sempre um uso criativo das cores para dar efeitos narrativos e ampliar significados.

Fallen Angels, de 1995, não é tão vangoghiano quanto Ashes of The Time, mas cria um visual um tanto cyberpunk, ligeiramente embaçado e "encaixotado" para Hong Kong dos anos 90.

É como se o espectador estivesse sob efeito de alguma droga, não tão forte para distorcer tudo, mas o suficiente para mantê-lo num estado alterado de alerta, de pesadelo sutil.

Em entrevistas, Wong Kar-wai disse que o filme é sobre a noite de Hong Kong. E, nisso, lembra algo como uma graphic novel estilo Sin City, lançada alguns anos antes, em 1991. Os personagens são criaturas noturnas folclóricas do "submundo". Um assassino de aluguel e sua agente, um ex-presidiário mudo, que vive num apartamento horrível com o pai e uma garota quase sempre surtando de ciúmes.

Mas, se Fallen Angels parece não ser uma visão exatamente "turística" de Hong Kong, também é, essencialmente, uma reflexão sobre o amor. Claro, é um filme de Wong Kar-wei, certo? Aqui, o tema é o amor platônico.

O que Nelson Rodrigues diria sobre esse filme?

Enfim: todos os amores estão no plano das expectativas, até mesmo quando há contato físico. Por exemplo, o assassino faz sexo com uma garota. Mas ambos estão apenas parcialmente presentes na atividade: pensam em outros parceiros. Os corpos são uma tela para projetar fantasias. A fisicalidade, ali, é só um suporte para o imaginário.

Violência: essa muleta desgastada #

Falando assim, parece ser possível esquecer que Wong Kar-wei escolhe perder tanto tempo do filme com aquela estética de submundo noturno glamorizado, que foi tão comum na cultura pop dos anos 90. Armas, sangue, sarcasmo. Que saco.

Um assassino de aluguel vestido com um blazer por cima de uma camiseta regata, entrando num bar e atirando em diversas pessoas, com dois revólveres, enquanto rumina sobre algo prosaico, em voice-over. Existe algo mais anos 90, mais datado?

Haja paciência para essa estética de quem assiste à violência no conforto do sofá. De quem, provavelmente, nunca teve um revólver apontado para sua cabeça.

Ainda assim, Fallen Angels é um curioso contraponto às imagens que aprendemos a associar à China: um estado de vigilância, que mantém a criminalidade sob controle.

Marketing Mudo #

As melhores partes do filme são as aparições do ex-presidiário mudo. Ele faz o que podemos chamar de marketing realmente agressivo: invade estabelecimentos e força as pessoas a comprarem seus produtos (de um jeito um tanto humorístico). E em quantidades generosas: "ah, você quer sorvete? Então vai comer até acabar todo o estoque do caminhão". No estilo "não aceito não como resposta". Acaba que todos compram logo ou fogem do personagem. Mas o mudo é implacável. Excelente atuação de Takeshi Kaneshiro.


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