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Jantar de campeões

Por Eduardo Fernandes.

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Dzongsar Khyentse Rinpoche, ou Khyentse Norbu.

Ontem, assistindo a uma palestra de Dzongsar Khyentse Rinpoche, lembrei-me de quando jantei com ele, há alguns anos. Mas, antes de contar essa história, vamos para outro jantar. Esse com Roberto Civita o, então, dono da Editora Abril.

Falando para relaxar #

2007: eu acabara de pousar na (então) poderosa Abril, como editor do site da Superinteressante. Na época, a revista era um dos maiores sucessos da casa.

Civita queria conhecer algumas equipes. E, como havia muita expectativa / apreensão sobre como a Internet mudaria o mercado editorial, disseram que eu não poderia fugir desse jantar. Ok. Amen, Regininha, amen.

Assim, eu e mais 6 pessoas fomos para a gigantesca sala de jantar de Civita — parte de um escritório que ocupava um andar inteiro.

Na mesa, o desconforto era geral. Não por conta de Civita, que era cordial, com sua voz de baixo-profundo. É que se manifestou o DNA de humildade brasileira diante do colonizador, o adestramento histórico de tentar agradar o patrão. Todos nós travamos, exceto o gente-finésima, Denis Russo Burgierman.

Em poucos minutos, o desconforto migrou do silêncio para a incessante tagarelice. Nunca se viu tanta gente esperta num só lugar. Ainda era o DNA brasileiro: falávamos para, de alguma forma, provar que “merecíamos” estar ali e subir de vida.

Porém, quem diria, hoje a Abril está atolada em dívidas, muitas revistas se dissolveram, alguns prédios da editora foram vendidos e até Civita morreu em 2013.

Jump cut para Khyentse Rinpoche.

Silenciar para relaxar #

Lá estava o Eduf, de Pirituba, sentado à mesa com um dos mais importantes professores budistas da atualidade (e de todos os tempos).

Ele é conhecido por ser brincalhão e informal, o que pode levar à falsa conclusão de que seja manipulável, como uma celebridade comum. Por exemplo, consciente ou inconscientemente, você poderia tentar inflar seu próprio ego, apenas por estar por perto de Rinpoche.

“Veja” bem, tentar.

A conversa começou no futebol, que ele adora e conhece bem. Já eu, tenho uma vaga lembrança de que é algo que envolve pessoas correndo atrás de uma bola.

Alguns dos colegas de mesa conseguiram se engajar. Mas, à medida que Rinpoche se aprofundava, ficou claro que falávamos sobre algo que não entendíamos. O primeiro a ser honesto foi um colega chileno. Ele apenas sorriu e disse “desculpe-me, não acompanho futebol”.

Então, migramos para a política. Aí comecei a tentar entreter o Rinpoche (já que sou formado em Ciência Política).

Evidentemente, os assuntos que abordamos eram complexos. E Rinpoche é um provocador nato: se ele percebe que você é esquerdista ou direitista (ou qualquer “ista”), ahh, ele apontará seus pontos fracos. Chegará nos substratos emocionais das suas opiniões, revelará aquilo que você reprime e expressa como “inteligência” e “estou do lado certo”.

Gradualmente, todos fomos caindo. Até os alunos mais próximos dele. Em certo ponto, pensei: “O que estou fazendo? Querendo entreter o Manjushri?” Desisti do meu esquema de aquisição de autoestima.

E, simplesmente, surgiu um silêncio natural, nada constrangedor. Pelo contrário: um conforto de não ter assunto, de não falar. Um certo relaxamento, sem aquele nervosismo do jogo do entretenimento.

Até que Rinpoche apenas sorriu e se levantou: “muito obrigado. Foi um excelente jantar”.

So it goes.


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