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O guru de Malibu

O guru de Malibu

Por Eduardo Fernandes.

Estou lendo The Creative Act: A Way of Being, do prestigiadíssimo produtor musical, Rick Rubin.

Rick fundou o selo Def Jam nos anos 1980 e foi um dos responsáveis pela popularização do hip-hop. Desde então, trabalhou com muita, mas muita gente diferente: de Slayer a Johnny Cash e Red Hot Chili Peppers. É tido como um Midas contemporâneo: onde toca, surgem discos de Platina. E se especializou em reciclar artistas em baixa.

Mas agora ele assumiu de vez o tom de guru de Malibu (onde fica seu estúdio, Shangrila). Seu livro é uma mistura de ensaio com poesia e autoajuda. Se você esperava um compêndio de histórias de bastidores e insights das suas relações com músicos, vai se decepcionar.

Mas, em si, até que The Creative Act é interessante. Particularmente se você gosta de Catching The Big Fish, do cineasta David Lynch. E de frases um tanto herméticas, que podem ser decodificadas em momentos de busca por inspiração. Não chega a ser um Oblique Estrategies, de Brian Eno, mas tem um pé nesse estilo de comunicação.

Basicamente, Rubin pega algumas ideias que circulam há anos entre meditadores de várias cepas e tenta aplicá-las ao ato criativo. Por exemplo, o exercício de se conectar com tipos de percepção menos centrados na burocracia do ego (e em seu desejo de controle). Também considera a arte mais como uma atitude, um estilo de vida, do que a produção contínua de produtos físicos e/ou digitais.

Como autor, Rubin trabalha no nível do sample, misturando fragmentos de ideias debatidas por vários teóricos, historiadores e filósofos da arte, além de tradições religiosas, sem se preocupar em dar muito crédito. Nisso, é um livro bem atual: é meio assim que nos comunicamos no cotidiano, de um jeito geek, mas impreciso. Muitas vezes, sem saber direito o que é a ideia, de onde ela veio, mas, tudo bem, no final acaba funcionando. A Era da Bricolagem.

O único problema desse método, é que ele é tão, digamos, solto, que não percebe sua própria ambiguidade e contradição. Por exemplo, Rubin passa páginas nos recomendando relaxar e depois se sai com o seguinte verso, sozinho, enfático, numa página:

Olhe para o que você percebe
mas ninguém mais vê.

Pronto, estamos de volta ao mundo do ego: “o que será que só eu percebo? Como saber se mais alguém viu isso? Essa é uma percepção original?”

Enfim, se você quer um livro que realmente leva a ideia da arte sem ego às suas consequências, minha sugestão é True Perception, de Chogyam Trungpa. Provavelmente, artistas vão brigar com o livro o tempo todo. Já o texto de Rubin está mais para relaxar, pensar um pouco e voltar ao trabalho. Ainda assim, é bem melhor que hustle culture.


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