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Oops. Você foi censurado

Por Eduardo Fernandes.

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"Desculpe-me, Dave, você digitou as palavras-chaves erradas".

Você escreve um romance. Digita mil palavras num processador de textos on-line. Então, certo dia, tenta abrir o documento para revisá-lo. De repente, “desculpe-me, Dave”. O texto foi escaneado via machine learning e censurado. Você não tem mais acesso a ele.

Segundo a MIT Tech Review, foi o que aconteceu recentemente com uma novelista chinesa, que usava uma espécie de Google Docs local, o WPS.

Furiosa, a autora reclamou na rede social Weibo e seu post viralizou. Oops. A denúncia ficou mais famosa do que a obra. Mais: ela despertou atenção negativa para a empresa por trás do WPS, Kingsoft, que teve que se explicar em público. Assim, também expôs os limites da Lei de Ciber-segurança chinesa.

Ou seja, mesmo num país ditatorial, a censura acabou provocando mais barulho do que silêncio. E, provavelmente, o romance foi pego pela paranoia descalibrada de algoritmos que não sabem distinguir contextos e nuances.

A reportagem da MIT é bem vaga (alerta de factoide). Ainda assim, serve para nos lembrar de duas palavras (grudadas): YouTube. Quantas vezes você já ouviu autores reclamarem de terem vídeos desmonetizados ou tirados do ar graças às barbeiragens das máquinas de aprender?

A vantagem que temos ao utilizar os aplicativos monopolistas norte-americanos é que, procurando bem, em algum lugar encontraremos um botão para reclamar. Em alguns casos, será até possível resolver a situação temporariamente. Mas não conte com isso.

Nossa tendência é pensar que as ferramentas de repressão são mega eficazes e monolíticas. Mas, no fundo, tanto as democracias quanto os países ditatoriais estão cada vez mais parecidos com o Brazil, aquele filme do Terry Gilliam. Burocracia, burocracia e burocracia. Formulários, procedimentos e negociações infinitas. Agora com interfaces de usuário. UI é o sexto poder. Ou sétimo – já perdi a conta.

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Cena de Brazil, o filme.

Franz Kafka se preocupava com o nonsense da burocracia, que é um subproduto da tentativa de gerenciar massas de humanos usando padrões abstratos. No caso da sua obra (e também em “Brazil”), o que causava problemas era a combinação de três polos de erros: os funcionários, as máquinas e os procedimentos padronizados. Hoje em dia, adicionamos programadores e designers à equação.

Nossa época acredita ainda mais na ideia de que quanto mais dados coletarmos, mais precisos ficaremos. Por isso a necessidade de processar palavras-chave, dados de telemetria, estatísticas, etc. Porém, sempre acabamos criando mais buracos de coelho e novos geradores de caos. Daí mais "necessidade" de controle e censura.

O sonho tecnocrático da automatização do governo ainda está longe de ser realizado. Afinal, ainda que nossa privacidade seja invadida constantemente, ainda que as máquinas saibam tudo sobre nós, sua eficácia em contextualizar dados varia muito. Aparentemente, são super espertas para sugerir anúncios. Mas meio estúpidas para gerenciar ideias.


Aviso para quem usa Protonmail #

Por falar em máquinas causando problemas, depois da última reforma do Protonmail, alguns leitores não estão recebendo a newsletter. Se é o seu caso, vale seguir os procedimentos descritos aqui. Estou pesquisando se há algo que eu possa fazer para evitar problemas como esses.


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