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Os Sonhadores Parte 2

Por Eduardo Fernandes.

Porque, em geral, só se faz sequências pra filmes ruins?

Esse seria meu plano pra uma continuação do filme Os Sonhadores, clássico de Bernardo Bertolucci.

(A partir daqui, estou assumindo que você viu o filme e sabe como ele termina.)

Estamos em 2018. Mattew mora em Nova Iorque. Ele recebe um e-mail de uma mulher chamada Anna Karina. Ela diz ser francesa e filha de Isabelle.

Isabelle está num estágio avançado de câncer. Anna quer que a mãe encontre Mattew antes de morrer.

Depois de alguma hesitação, ele embarca pra Paris. É recebido por Anna, que se oferece pra hospedá-lo na casa da família, herdada dos avós. Ele prefere se hospedar num hotel.

A partir de então, acompanhamos a jornada de Mattew tentando evitar encontrar com Isabelle.

Ele percorre Paris com Anna, conversando e visitando os lugares que frequentou com Theo e Isabelle.

Mas Mattew e Anna nunca falam sobre os gêmeos. Os diálogos ou são small talk ou tratam de cinema. Os dois personagens estão se conhecendo. Existe uma curiosidade estranha entre eles.

Anna percebe que Mattew está abalado com as memórias da sua juventude. Por meio de suas conversas oblíquas, cheias de citações do cinema, Anna deduz que Mattew se sente culpado por ter abandonado Theo e Isabelle bruscamente, no meio de um protesto estudantil, em 1968.

Anna entende que Mattew voltou aos EUA e tentou apagar os gêmeos da memória. Isso o levou até mesmo a abandonar sua obsessão pelo cinema. Então, o encontro com ela também se desenvolve como um reencontro com o amor ao cinema.

Anna respeita o tempo emocional de Mattew, mas sabe que Isabelle vai morrer logo. Então, aos poucos, ela começa a introduzir notícias sobre o que aconteceu depois que o americano partiu.

As revelações são sempre ligadas a um local específico de Paris ou a algum filme. Por exemplo, ela conduz Mattew ao lugar exato onde Theo morreu, na própria noite do protesto. Theo foi atingido por estilhaços de um coquetel Molotov.

É importante que as revelações não sejam contadas nem por exposição e nem por flashbacks. Teremos apenas indicações sutis dos fatos. No caso da morte de Theo, Anna fala sobre as mortes de estudantes nos protestos, enquanto Mattew vê uma garrafa estilhaçada no chão.

Então, Mattew começa a visitar boates específicas de Paris, não só da cena LGBTQ+, mas também vê outros estilos de práticas sexuais (mostradas sutilmente, já que ele só está observando o que as pessoas fazem em público). Começa a perceber como as coisas mudaram. O que ele fazia com os gêmeos em 1968 não parece mais tão desafiante.

Ou seja: durante o dia, Mattew faz uma exploração cultural de si mesmo, com Anna. À noite, explora sua própria sexualidade, sozinho.

Anna e Mattew visitam o Hospital de Salpêtrière. Aos poucos, começamos a entender que Isabelle foi brevemente internada num hospital psiquiátrico. Depois da morte do irmão, ela se envolveu em atitudes autodestrutivas e os pais intervieram.

Mas Isabelle saiu do hospital assim que os médicos descobriram que ela estava grávida.

Aos poucos, começa a ficar claro que Anna é filha de Mattew. Ela foi proibida pela mãe de tentar entrar em contato com o pai. Mas tudo isso é revelado por meio de citações ao cinema clássico dos EUA. A narrativa vai se montando aos poucos, conforme os dois discutem os filmes.

Isabelle não quis ter outro amante, porque Mattew era o único que estava associado a Theo. Foi o único oficialmente "aceito no grupo". Anna foi criada pelos avós. Assim, Isabelle se tornou uma mãe ausente, autocentrada, passando por períodos de depressão e euforia.

Os dois entendem a situação. Mas nunca se fala abertamente sobre o assunto.

O filme termina com Mattew no hospital, prestes a visitar Isabelle. Finalmente, ele admite que não sabe se vai conseguir ver a ex-amante.

Da porta do quarto, Anna faz um dos jogos de adivinhação que Isabelle costumava fazer. Ela simula a cena de um filme. Diz que, se Mattew não soubesse seu título, o “castigo” seria entrar.

Terminamos a história com uma expressão confusa de Mattew. Não sabemos se ele acertou o nome do filme. Nem se visitou Isabelle.


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