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Pós-minimalismo

Por Eduardo Fernandes.

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Prédio da escola Dessau Bauhaus, por Moritz Kindler.

O prêmio de obsessão da semana vai para Valis. É uma fundação formada por intelectuais holandeses e belgas, que organizam conferências e publicam livros sobre artes, sociologia, urbanismo e política.

Em especial, me interessei por CAPS LOCK, how capitalism took hold of graphic design and how to escape from it, de Ruben Pater. O livro toca em assuntos de que tratei em outra ocasião: como nossa percepção do que é "bom design" foi definida pelo capitalismo nas últimas décadas.

Doença congênita #

Na verdade, a própria ideia moderna de design nasce da aceleração da economia de mercado, a partir do pós-Segunda Guerra, e se fortalece durante a Guerra Fria.

Evidentemente, as ideologias da Bauhaus (presentes em quase todos os aparelhos que usamos) são abertamente inspiradas pelo industrialismo: padronização, produção em larga escala e busca por um ideal prístino de limpeza e simplicidade.

A apropriação do minimalismo #

O minimalismo e a suposta atenção aos detalhes foi redefinida e re-empacotada por empresas como a Apple. Hoje, são valores quase que inquestionáveis, vendidos como prova irredutível de qualidade. E até mesmo como um estilo de vida.

Porém, não podemos nos esquecer de que essas são ideologias um tanto perigosas, já utilizadas até pela eugenia, tanto nazista, quanto aliada.

O minimalismo moderno tenta esconder as complexidades dos sistemas humanos (incluindo o design). Por trás dos seus espaços em branco e tipografia neo-grotesca, cria um falso ambiente de segurança, organização e sofisticação.

Mas, por baixo do design limpo e supostamente eficiente, há inúmeras mecânicas e práticas monopolistas, destruição do planeta, exploração de populações fragilizadas, sexismo, misoginia, busca do lucro via colonização da psiquê, indução ao vício, etc.

Design de desafio #

E por que estou falando sobre isso? Por que voltei a trabalhar 100% do tempo no Linux — o que tem sido uma experiência bem satisfatória.

Não que a maioria das distribuições atuais tenha conseguido se imunizar contra a estética Apple, pelo contrário. Vide os ambientes de desktop Deepin, Cutefish, entre outros.

É que, cedo ou tarde, você sempre se depara com alguma incoerência, falta de padronização ou detalhe caótico — o que eu chamaria de verdadeira interface humana.

Os outros sistemas operacionais também têm suas inconsistências, é claro. Mas, no Linux, existe quase que uma atitude psicológica de desafio, que atrai alguns tipos de personalidade.

Assumindo a "sujeira" #

Por mais eficiente que o Linux seja hoje em dia, feliz ou infelizmente, sempre acaba convidando o usuário a aprender. Talvez isso seja estranhamente vantajoso num mundo repleto de sistemas emburrecedores, que desenvolvem a preguiça progressiva e a dependência psicológica da conveniência.

Seja lá qual for seu sistema operacional favorito, não é um absurdo imaginar outros valores para o design, que deveria ir além de promover padronização e externalização de custos. Poderia desenvolver a abertura mental, a disposição para pedir e oferecer ajuda, a capacidade de improvisar e de questionar hábitos.

Desprodutivização #

Não podemos acreditar cegamente em valores enganosos como produtividade e eficiência. Há outros fantasmas culturais mais camaradas para nos assombrar.

Se o design não encontrar um jeito de incorporar qualidades humanas como o erro, o jogo e o aprendizado, em breve ficaremos tão atrofiados mentalmente que precisaremos de academias para o cérebro. Ou personal brain trainers. Acorde cedo e faça exercícios para não ficar estúpido, by design.