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Correndo atrás de prazer

Por Eduardo Fernandes.

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David Bowie, ch-ch-changes.

Depois de dois anos de produção contínua de newsletters, podcasts e até vídeo, vou tirar um mês de férias. Se você chegou agora, confira as edições anteriores.

Confesso que ando meio cansado de Internet. E isso acaba se refletindo na criação, que fica mais mal-humorada, arrastada, repetitiva e superficial. Então, está na hora de uma “pausa disruptiva”.

E, ahá, chegamos ao nosso assunto principal.

Nesta semana, um post de Adam Mastroianni viralizou no Hacker News. Chama-se “As Cinco Ferramentas do Design Hedônico”. O texto trata de mais um daqueles termos que psicólogos contemporâneos criam para reciclar ideias antigas. No caso, “esteira hedônica”.

Ou seja: “we can’t get no satisfaction”. Por melhor que seja a situação, sempre buscamos o próximo platô de prazer. É como um ciclo: hábito, tédio, comichão de identificar defeitos, criação de novos objetivos.

Mastroiani sugere cinco estratégias para suavizar esse mecanismo:

  1. Interrupções - quebrar suas atividades em tarefas menores e criar pausas entre elas. A ideia é interrompê-las para “refrescar” a atenção e o interesse.
  2. Encerramento - finalizar um projeto antes que ele fique chato. Assim, cria-se uma sensação de “quero mais”, em vez de “tive o suficiente”.
  3. Variações - criar formas diferentes de fazer a mesma coisa.
  4. Reciclagem - quando sabemos o momento certo de parar, surge a nostalgia e a possibilidade de revivals futuros.
  5. Picos e finais - não somos bons em analisar o encadeamento de processos. Tendemos a memorizar apenas os melhores ou piores “momentos de pico” das atividades. Os finais são especialmente importantes. Algo até pode começar mal, mas é bom que termine bem, porque é disso que nos lembraremos.

Enfim, esse é um velho senso comum aplicado universalmente. De exercícios físicos até religião. O que me lembra do conceito de Zona Autônoma Temporária, do polêmico Hakim Bey. E, claro, da análise da impermanência, que os budistas vêm fazendo há milhares de anos.

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Nossas atividades estão em constante transformação. O próprio início já contém a decadência. O sucesso é o começo do fracasso. Por mais estáveis que se pareçam, elas são formadas por partes interdependentes que também se transformam e se recombinam.

O problema da esteira hedônica é que acreditamos nela, achamos que precisamos mudar. Não reconhecemos o processo mental de deterioração do entusiasmo e da criação de novos desejos. Apenas queremos seguir o fluxo da ansiedade e do descontentamento contínuo.

Daí os limites das ideias de conservadorismo e de revolução. Como tudo está em constante mudança, a “disrupção” é o estado natural. Assim, também não há como ser conservador strictu sensu.

Quem manda aqui é a interdependência, que é tão vasta e complexa que pode tornar reacionários em revolucionários e vice-versa.

O que nos resta é entender os fenômenos como Ilusões Temporárias Aparentemente Autônomas. Fazer nossas apostas, identificar e corrigir as falhas rapidamente. E saber quando não agir, quando esperar. Aqui não há espaço para simplificações: parar também pode ser revolucionário.

Enfim, tudo para justificar minhas férias. Que horror. Até 14 de setembro. Cuide-se.

PS -- A newsletter para apoiadores ainda deve chegar nessa sexta.