Site do jornalista e roteirista Eduardo Fernandes

Colidindo com Lacan

Livro: Lacan Ainda: testemunho de uma análise Autora: Betty Milan Avaliação: 5 (de 10). Falar sobre sua própria análise é um pouco como contar sonhos: por mais interessantes que sejam, é difícil empolgar outras pessoas. É que faltam sempre contextos, imagens e até mesmo palavras para expressar esses momentos de, digamos, expansão de consciência. Tanto o sonho quanto a análise (e a meditação, claro) passam por um mergulho no tédio e também no assombro de descobrir como você funciona, na repetição, nos detalhes cotidianos. A descoberta de padrões simultaneamente pessoais e universais, a degustação dos paradoxos e a conciliação de dualidades, tudo isso se passa num nível que desafia a palavra e a linearidade. Assim, quando alguém se propõe a contar os sonhos e a análise, há um certo risco de criar uma narrativa um tanto anêmica ou, pelo menos, desconectada do leitor. Tudo isso para reconhecer a coragem de Betty Milan. No livro, ela não só relata vislumbres de sua análise, como ainda explica alguns dos métodos do seu analista. No caso, apenas um dos mais icônicos do século…

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O Jogo da Lula

[audio src="https://anchor.fm/s/4e33e304/podcast/play/41835004/https%3A%2F%2Fd3ctxlq1ktw2nl.cloudfront.net%2Fstaging%2F2021-9-15%2F5b124094-88f1-70e1-e970-3e25913f1345.mp3"][/audio] Vale ouvir também: Vox explica como Round 6 ganhou a Netflix. E A Nova crítica social sul-coreana. Fazendo suas compras regulares da Amazon via esse link afiliado, você ajuda o podcast (sem perder suas promoções, dados, Prime. E sem que os diletantes saibam o que você compra).

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Pós-minimalismo

Prédio da escola Dessau Bauhaus, por Moritz Kindler. O prêmio de obsessão da semana vai para Valis. É uma fundação formada por intelectuais holandeses e belgas, que organizam conferências e publicam livros sobre artes, sociologia, urbanismo e política. Em especial, me interessei por CAPS LOCK, how capitalism took hold of graphic design and how to escape from it, de Ruben Pater. O livro toca em assuntos de que tratei em outra ocasião: como nossa percepção do que é "bom design" foi definida pelo capitalismo nas últimas décadas. Na verdade, a própria ideia moderna de design nasce da aceleração da economia de mercado, a partir do pós-Segunda Guerra, e se fortalece durante a Guerra Fria. Evidentemente, as ideologias da Bauhaus (presentes em quase todos os aparelhos que usamos) são abertamente inspiradas pelo industrialismo: padronização, produção em larga escala e busca por um ideal prístino de limpeza e simplicidade. O minimalismo e a suposta atenção aos detalhes foi redefinida e re-empacotada por empresas como a Apple. Hoje, são valores quase que inquestionáveis, vendidos como prova irredutível de qualidade. E até mesmo como…

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Esforço e sucesso

[audio src="https://anchor.fm/s/4e33e304/podcast/play/41484542/https%3A%2F%2Fd3ctxlq1ktw2nl.cloudfront.net%2Fstaging%2F2021-9-8%2F71893cbc-8ca1-30e6-a3f2-1aee30817b57.mp3"][/audio] Quanta energia gastamos no cotidiano, de instalar sistemas operacionais até fazer dinheiro. Os limites da meritocracia e do esforço.

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Psico-corporativismo

Imagem via Annie Spratt. Se aprendemos algo nessa semana, foi o quão arriscado e triste é ter que depender de monopólios. E não me refiro apenas às corporações. O assunto aqui é o corporativismo psicológico, um hábito (até certo ponto) voluntário que desenvolvemos a cada dia. O psico-corporativismo se propaga via três mecanismos que se retroalimentam: Pressuposição da escassez. Você é levado a pensar algo assim: "Todo mundo usa o WhatsApp. Todos se comunicam via escárnio e ofensa. Todos consomem nas mesmas plataformas. Fazer o quê? Não há como fugir". Controle da diversidade. Na Internet, você encontra os nichos mais específicos. Porém, eles se comunicam e se desenvolvem via Twitter, YouTube, entre outras ferramentas uniformizantes. Então, são tratados como "tendências" ou "estéticas". O mito da inconveniência alheia. Aprendemos a lidar com as mumunhas e dificuldades de apenas alguns aplicativos. E não é que eles sejam fáceis. Apenas decidimos enfrentar as curvas de aprendizado de uns, pressupondo que os outros seriam muito piores. Por meio desses três elementos, reforçamos diariamente o hábito (de reforçar o hábito) de circular pela Internet centralizada.

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Facebook é tipo traficante?

[audio src="https://anchor.fm/s/4e33e304/podcast/play/41089227/https%3A%2F%2Fd3ctxlq1ktw2nl.cloudfront.net%2Fstaging%2F2021-8-30%2F893921f4-f03c-df4d-301d-a62e97f2a9d3.mp3"][/audio]

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Viva a sociedade alternativa

Mas é tão legal no papel! Um dos mitos mais recorrentes da história da humanidade é o da sociedade alternativa: um grupo de escolhidos, buscando uma terra prometida, com regras e condições melhores. Há variações dessa narrativa em praticamente todas as sociedades. Por que, então, não surgiria uma entre os entusiastas das criptomoedas? O jornal inglês The Guardian publicou a incrível história do ex-engenheiro do Google, Patri Friedman, neto de Milton Friedman, o economista cultuado pelos neoliberais. Patri juntou um grupo de milionários, comprou um cruzeiro de 245 metros e resolveu fundar uma utopia flutuante, gerenciada via bitcoin. O nome do navio? Satoshi, é claro. Em outubro de 2020, no meio da pandemia, Friedman tentou lançar sua "seavilization", trocadilho em inglês que significa civilização marítima. A audácia causaria inveja a Kevin Costner e Sr. Wilford: financiar, do próprio bolso, uma vila autônoma, livre, sustentável. E com vista para o mar. Friedman e parceiros passaram cerca de 10 anos planejando a operação. Afinal, teriam que gerenciar energia, alimentação, defesa e milhões de etcéteras. Spoiler alert, deram com os burros n'água. No…

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Corvos terroristas, drones e cavaleiros verdes

[audio src="https://anchor.fm/s/4e33e304/podcast/play/40760435/https%3A%2F%2Fd3ctxlq1ktw2nl.cloudfront.net%2Fstaging%2F2021-8-23%2Fdecb8537-1fdd-0695-db17-5f9f3472aaad.mp3"][/audio] Fazendo suas compras regulares da Amazon via esse link afiliado, você ajuda o podcast (sem perder suas promoções, dados, Prime. E sem que os diletantes saibam o que você compra).

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Digitalização da mente

Pelo jeito, nessa semana, serei pautado novamente pelas redes sociais. É que preciso desenvolver melhor algumas ideias do episódio sobre o Instagram do meu podcast. Resumindo: sim, precisamos regulamentar as redes sociais. Porém, isso não será o suficiente. E pode ser igualmente perigoso. Tentar APENAS regulamentar é como colocar couro no planeta inteiro em vez de usar sapatos. Ou seja: uma tarefa ineficiente e infinita. Assim, é importante também fortalecer as pessoas para lidar com situações de conflito. Ajudá-las a ter auto-eco-conhecimento (conhecimento de si, da dinâmica da sociedade e da inter-relação entre ambos). Lembra da velha e boa educação? Afinal, esse é o assunto aqui. As redes sociais não podem assumir o papel das escolas e educadores. Não basta combater a prática do bullying. É preciso criar redes de suporte psicológico, tanto para a vítima quanto para o algoz – que, geralmente, é vítima de outro bully, em casa. Ou seja: partimos do pressuposto de que todos os problemas são multifacetados e possuem várias possibilidades de intervenção. As redes sociais podem ser um bullying institucionalizado. Ou melhor, a exploração…

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Instagram: o reino da insegurança

Deu no jornal do Jeff Bezos, o Wall Street Jornal: segundo pesquisas do próprio Facebook, o Instagram influencia negativamente uma entre três adolescentes nos EUA. O estudo se foca no problema da imagem corporal. Promover padrões não-realistas de beleza no aplicativo levaria garotas a desenvolver depressão e até tendências suicidas. É como se o Instagram promovesse um bullying constante: "seu corpo é feio", "você não é apreciada como deveria", entre outros padrões negativos. Aqui, seria fácil chutar o cachorro agonizante: "as redes sociais são a nova indústria do tabaco". Porém, são apenas mais um capítulo da exploração de hábitos muito arraigados na espécie humana: no caso, a inveja. Ainda que seja necessário corrigir (e revolucionar) as redes sociais, a depressão decorrente da insegurança, da comparação e da inveja não será erradicada tão cedo. Nem a golpes de legislação, nem por redesign. A energia da inveja e da busca por se adaptar a padrões estéticos e culturais vem determinando a história da humanidade desde sempre. Talvez seja um bug / feature da espécie. A história está repleta de exemplos do poder…

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