Site do jornalista e roteirista Eduardo Fernandes

Comentando Fallen Angels, de Wong Kar-wai

Qual é a primeira coisa que vem à sua cabeça quando você pensa sobre os filmes de Wong Kar-wai? Na minha, são as cores. É claro: o cineasta chinês é reconhecido por suas explorações sobre as armadilhas dos relacionamentos amorosos, mas tudo é filtrado por uma direção de arte que enfatiza sempre um uso criativo das cores para dar efeitos narrativos e ampliar significados. Fallen Angels, de 1995, não é tão vangoghiano quanto Ashes of The Time, mas cria um visual um tanto cyberpunk, ligeiramente embaçado e "encaixotado" para Hong Kong dos anos 90. É como se o espectador estivesse sob efeito de alguma droga, não tão forte para distorcer tudo, mas o suficiente para mantê-lo num estado alterado de alerta, de pesadelo sutil. Em entrevistas, Wong Kar-wai disse que o filme é sobre a noite de Hong Kong. E, nisso, lembra algo como uma graphic novel estilo Sin City, lançada alguns anos antes, em 1991. Os personagens são criaturas noturnas folclóricas do "submundo". Um assassino de aluguel e sua agente, um ex-presidiário mudo, que vive num apartamento horrível com…

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Comentando Ashes of Time, de Wong Kar-Wai

É costume dizer que, no começo dos anos 2000, Wong Kar-Wai criou uma trilogia clássica de filmes sobre amor. Mas, afinal, quais filmes dele não são sobre amor? Ashes of Time (Redux), de 1994, não é exceção. Se, como argumentei anteriormente, Fallen Angels é sobre amor platônico, Ashes of Time é sobre rejeição e amores circunstancialmente impossíveis. Aqui, vemos uma sucessão de vários fragmentos de histórias, conectada pelas expectativas e inibições culturais do mundo dos samurais – ou, pelo menos, tais como elas são narradas por autores urbanos e contemporâneos. E, então, essas narrativas giram por temas como lealdade, vingança, busca pela respeitabilidade e por padrões de excelência, na prática de esgrima. Ashes of Time não é um filme fácil de acompanhar. Assim que você começa a se "apegar" a um personagem e a seguir seus conflitos, o foco narrativo muda. No entanto, é possível dizer que há um protagonista: Ouyang Feng, um assassino de aluguel, que vive praticamente solitário num deserto, retratado em cores saturadíssimas, o que confere um tom surreal ao local. Feng parece ser um mestre de…

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O direito de fazer gambiarra

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Deixe esse algoritimo decidir

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Comentando o mangá Hokusai

Mais um documento sobre o Sofrimento da Condição Artística (SCA). Dizendo assim, parece algo trágico. E é. Pense em conviver diariamente com uma inquietação e descontentamento, procurando seu próprio estilo, seus assuntos e sua maneira de expressá-los. Mesmo que você consiga encontrá-las, mesmo que seja respeitado e até faça fama e dinheiro, você nunca está feliz. Esse é parte do SCA, que, feliz ou infelizmente, ainda não é uma doença classificada nos manuais de psiquiatria. Em certos círculos, tende a ser valorizada como uma espécie de mal necessário. Ou uma insalubridade, risco da profissão: entregadores do Amazon têm que mijar em garrafas na rua pra não perder tempo, artistas precisam sofrer pra produzir arte "profunda". Ambos são (potencialmente) mal pagos e não têm muitos direitos trabalhistas. Se isso é basicamente verdade hoje, imagine no Japão da Era Edo. Hokusai, o mangá, é um esforço de um dos maiores e mais prolíficos quadrinistas japoneses, Shotaro Ishnomori, de imaginar a mente do ainda mais influente e produtivo mestre da ilustração e narrativa visual, cujo pseudônimo mais conhecido foi Katsushika Hokusai. Ao todo,…

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Queimando até a última ponta

"Burn-out" é uma das expressões mais ouvidas na atualidade. Tão disseminada, que já entrou pro Reino dos Conceitos Ectoplásmicos, aquelas ideias que, quando ouvimos, sabemos do que se trata, mas é só tentar explicá-las que se tornam insubstanciais, vagas e até assustadoras. É que não há exatamente um consenso entre os pesquisadores a respeito do assunto, mas há alguns sintomas comuns. A vítima do burn-out se sente… Um artigo da New Yorker questiona se o burn-out seria um fenômeno contemporâneo ou um bug da espécie humana. O texto de Jill Lepore traça as origens do uso da expressão. Conta a história dos primeiros diagnósticos da doença, que surgiram entre os militares e depois migraram pros profissionais de saúde. Também compila os principais livros e artigos científicos sobre o assunto. Vale muito a leitura. Há vários contextos de “tratamento” do burn-out: Vamos nos concentrar no aspecto mais psicológico do burn-out. De modo geral, é uma doença relacionada ao orgulho. Que se manifesta nos seguintes sintomas: Burn-out pode ser o subproduto da síndrome do Super homem, de querer ser reconhecido (por si…

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O Vagabundo Iluminado

[audio src="https://anchor.fm/s/4e33e304/podcast/play/33490648/https%3A%2F%2Fd3ctxlq1ktw2nl.cloudfront.net%2Fstaging%2F2021-4-14%2F00463a14-cb94-1d65-50ee-51392a1d7c0e.mp3"][/audio] Semana que vem voltaremos à programação "normal". Citados no episódio # Livro Enlightened Vagabond, que Eduardo Pinheiro está traduzindo. Coisas que Pinheiro publicou em seu site sobre Patrul Rinpoche. Matthieu Ricard.

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E aquele TikTok do Platão?

Há escritores que eu adoraria que tivessem produzido pra plataformas digitais. Um bom exemplo é Jorge Luis Borges. Outro dia, lendo a transcrição de sua palestra sobre As Mil e Uma Noites, a cada parágrafo, eu quase rezava por links pra Wikipedia. Não só pra decodificar melhor o texto, mas também pra satisfazer as curiosidades que iam surgindo. Borges, definitivamente, não é um autor linear. Seus textos têm aquela qualidade de devaneio, de milhões de citações borbulhando em todos os cantos, o que irrita muitos acadêmicos e jornalistas. O escritor argentino deve ter batido algum recorde de número de assuntos por frase. Imagine se ele tivesse escrito seus ensaios num blog old-school, como o do Cory Doctorow. Seria o inferno dos links. Texto todo sublinhado. Iria se parecer com uma revista do David Carson nos anos 90. Não estou criticando, apenas imaginando. Como seriam as contas de Twitter dos aforistas Sir Francis Bacon (@NovumOrganum) e Sêneca? Ou o canal de YouTube, estilo video log, de Santo Agostinho (Confissões)? O podcast de Karl Marx? A newsletter fluxo de consciência de Samuel…

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A história do programa de áudio Audacity

Acho que este é um post no estilo #gratidão. E também #apreensão. É que acabei de saber que um dos aplicativos que mais uso (e há mais tempo), o editor de áudio open-source e gratuito, Audacity, agora faz parte de uma nova empresa chamada Muse Group. Quem? Pois é, também não conheço. A seguir, um vídeo explicando não só a "aquisição" como a história do programa. Destaque pros diversos usos que ele ganhou ao longo dos anos – incluindo descobrir mensagens alienígenas em arquivos de áudio. Interessante também notar faixa etária dos principais desenvolvedores (por volta dos 60 anos). Muita gente acha o programa bagunçado e feio. Eu também. Mas e daí? Ele é tão eficiente, flexível, leve e customizável que é quase que uma segunda linguagem pra mim. Já fui hard user do Cubase, e o Reaper é minha segunda opção, hoje em dia. Ainda assim, sempre prefiro trabalhar no Audacity (nos podcasts). Sou muito grato pelo trabalho dos desenvolvedores. Vou torcer pra que o Audacity não se perca, nessa nova fase.

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E se o Estado comandasse a Internet?

[audio src="https://anchor.fm/s/4e33e304/podcast/play/33017323/https%3A%2F%2Fd3ctxlq1ktw2nl.cloudfront.net%2Fstaging%2F2021-4-7%2Fbd9c9fef-49ac-2488-b707-c141693e7ad1.mp3"][/audio] Fazendo suas compras regulares da Amazon via esse link afiliado, você ajuda o podcast (sem perder suas promoções, dados, Prime. E sem que os diletantes saibam o que você compra).

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